Dogma enfrenta ruptura interna e acusações públicas: trio de ex-integrantes denuncia manipulação e falta de transparência

Crise expõe bastidores de uma banda que se apresenta como símbolo de liberdade, mas é controlada por um único criador

Crédito foto: Sidney Oss Emer | oSubsolo


O projeto Dogma, conhecido por sua estética ritualística e discurso de libertação, vive um dos momentos mais turbulentos em tempos recentes. Três das integrantes — Lilith (Grace Jane), Lamia (Aveya) e Rusalka (Patri Grief) — anunciaram sua saída por meio de uma longa carta aberta publicada nas redes sociais, acusando o criador e atual detentor dos direitos do nome de manipulação, mentiras aos fãs, controle unilateral e traição artística.


“O que está sendo vendido hoje não é Dogma”, afirmam as ex-integrantes em uma das postagens. O texto, dividido em três partes, cita “promessas quebradas, decisões unilaterais, maus-tratos e mentiras aos fãs”, além de denunciar que o responsável pelo projeto “transformou uma banda em uma marca e pessoas em peças descartáveis”.


A publicação, assinada pelas três artistas, que inclusive acabam por revelar suas identidades a público, rapidamente ganhou força entre fãs, que passaram a questionar a legitimidade de um grupo que sempre se apresentou como coletivo feminino, mas que, segundo as denúncias, é inteiramente controlado por um homem que não atua como músico ou performer, e sim como gestor e dono da marca Dogma.


Confira a versão traduzida da carta abaixo:

A carta aberta na íntegra (tradução)

“Os fãs merecem a verdade.
Fomos parte da Dogma. Amamos esse projeto, mas o que está sendo vendido hoje não é a Dogma.
Durante as turnês, vimos decisões unilaterais, promessas quebradas, manipulação, maus-tratos e mentiras aos fãs.
A pessoa que agora controla o projeto é uma ameaça ao futuro da Dogma e não é um artista ou músico.
Ele transformou uma banda em uma marca e pessoas em peças descartáveis.

Traiu os artistas, os parceiros e os fãs.
A Dogma nasceu da conexão da música, das histórias que compartilhamos com vocês.
Substituir pessoas sem honestidade não é quem somos.

A Dogma sempre foi sobre liberdade e libertação e nada disso pode existir sem integridade e honestidade com os fãs e com todos os envolvidos.
Não queremos ver mais fãs enganados, gastando seu dinheiro e devoção em algo vazio.
A verdadeira Dogma está aqui, com quem criou essa conexão de verdade.
Mas o poder não está em nossas mãos, está nas de vocês.
Sempre esteve.
Vocês decidem quem merece manter a música viva. Nenhum empresário pode controlar isso.
Façam sua voz ser ouvida.
Não apoiem uma mentira.
As redes sociais sob o nome “Official Dogma” não representam mais a verdadeira banda nem o que defendemos.
Exijam transparência.
Peçam reembolso se não receberam o que foi prometido.

Não deixem que ninguém os manipule.
E, a partir de agora, sem mais máscaras.
As máscaras foram criadas para proteger identidades, não para substituir pessoas.
A única pessoa que precisa tirar a máscara é ele.
O poder de mudar essa história começa com o apoio de vocês.
Continuaremos.
A música, a criatividade e a verdade estão do nosso lado.

Colocamos nossas almas nesse projeto, e é por isso que vocês se conectaram conosco.
Nenhum empresário deveria ter o direito de tirar isso.
Lilith, Lamia & Rusalka"

Clique aqui para acessar a publicação original.


Enquanto as ex-integrantes expõem publicamente o que chamam de “bastidores de manipulação”, nos últimos dias, as únicas publicações foram adiamentos de shows nos Estados Unidos, com mensagens enigmáticas e poéticas, sem relação direta com a crise.


Agora, através da página oficial do Instagram, a Dogma se pocionou:


"Estamos cientes das recentes declarações online feitas por algumas ex-integrantes não originais da Dogma. Embora respeitemos todas as pessoas que contribuíram para nossa trajetória, queremos deixar claro que a Dogma sempre foi, e continuará sendo, muito maior do que qualquer indivíduo.


A Dogma foi fundada sobre os pilares da criatividade, colaboração e evolução. Como em qualquer projeto artístico, a mudança faz parte do nosso crescimento. Cada integrante, passada ou presente, deixou uma marca que ajudou a moldar quem somos hoje, mas a visão e a música da Dogma continuam avançando graças à dedicação da equipe atual e ao apoio de nossos fãs.


Somos gratos pelo tempo, energia e momentos que cada integrante compartilhou com a Dogma. Cada contribuição, grande ou pequena, tornou-se parte dessa jornada e será sempre valorizada e reconhecida.

Permanecemos totalmente comprometidos com os valores que definem a Dogma: autenticidade, liberdade de expressão e conexão através da arte. Nosso foco é, e sempre será, a música, a mensagem e a comunidade que tornaram este projeto o que ele é.


Agradecemos a todos que continuam acreditando na Dogma e no que representamos, pois a Dogma nunca foi sobre quem somos, mas sobre o que você escolhe se tornar."


As apresentações em Anaheim (CA) e Reno (NV) foram oficialmente adiadas, com a justificativa de “forças além do controle”. O tom místico dos comunicados contrasta com o teor direto da carta publicada e reforça a percepção de que a banda tenta manter uma aparência ritualística enquanto enfrenta um colapso interno.

Criada com uma proposta que mistura metal, performance teatral e simbolismo religioso, a Dogma  ganhou notoriedade nas redes sociais por sua identidade visual marcante: freiras mascaradas e atmosfera de missa profana, similares ao estilo incorporado por bandas como Ghost, tendo como mensagens o empoderamento, o feminino e a libertação espiritual/moral.


Entretanto,  o projeto é registrado como uma marca pertencente a um único criador, que detém todos os direitos sobre o nome, o conceito e a estética da banda. Na prática, isso significa que integrantes podem ser substituídas sem que o nome ou a identidade visual sejam alterados, o que levanta questionamentos éticos sobre autenticidade, autoria e coerência artística, questões essas que já aconteceram anteriormente, em que você pode ver alguns destes pontos neste post via Reddit  da comunidade: Clique aqui.


Essa estrutura de controle empresarial cria uma contradição: enquanto o discurso público da Dogma  fala sobre liberdade e rebelião, internamente o projeto parece operar sob uma lógica hierárquica rígida, onde as artistas são intérpretes substituíveis de um produto maior.


Uma gravação recente de um show em Las Vegas, disponível no YouTube, acendeu ainda mais críticas entre os seguidores. Na apresentação, as guitarras e vocais parecem pré-gravados, com apenas baixo e bateria executados ao vivo, aparentemente já com a nova formação, onde as novas integrantes estariam improvisando. O episódio levantou questionamentos sobre a autenticidade  e sobre até que ponto as mudanças internas já estavam em curso antes do rompimento oficial.


A reação online foi imediata: comentários exigindo explicações, pedidos de reembolso de ingressos e meet & greets, e apoio em massa às ex-integrantes tomaram as redes.

Sem pronunciamento oficial por parte do criador, o futuro da Dogma permanece incerto, justamente pela proporção da exposição ocorrida, diferentemente de momentos anteriores e talvez como consequência da crescente exposição e ganho de fãs nos últimos tempos. O projeto, que se apresentou pela primeira vez no Brasil no ano passado, no Odin’s Krieger Fest (2024) e este ano, no Bangers Open Air (2025), com shows ainda de apoio a Fábio Lione, em algumas de suas datas pelo Brasil, pode enfrentar um colapso de imagem caso não haja respostas claras e uma reestruturação transparente. Abrahel e Nixe, a baterista e baixista, respectivamente, não se pronunciaram sobre o caso.


O episódio expõe um dilema recorrente na indústria musical: quando o conceito ultrapassa os criadores, onde termina a arte e começa o produto?