Coletiva de Imprensa: Nervosa (SP)

Texto por: Rato de Show

Fotos por: Vinicius Vieira

Agradecimentos: Yara Haag


O ano de 2025 veio para sacramentar diversos acontecimentos no metal, tanto internacional quanto nacional, de conquistas a perdas, de lançamentos a marcos. Dentre eles, um que sem dúvidas não poderia passar batido está na celebração de 15 anos de estrada da Nervosa, banda de death/thrash metal 100% feminina que é hoje uma das principais potências nacionais em termos de projeção e alcance.


Sendo um dos grandes baluartes quando se fala em representação feminina na cena, além de um exemplo de perseverança, conquistas e boa música, o grupo vivenciou nos últimos anos uma montanha-russa de sentimentos e sensações: mudanças de formação, turnês nos principais festivais europeus (com presença confirmada no Hellfest deste ano), e tudo isso sem nunca deixar de ser firme em seu propósito, garantindo que sua mensagem sempre fosse espalhada.


Sendo este um ano simbólico, elas o iniciaram deixando sua marca na agenda paulista ao serem uma das grandes atrações do 1º Dark Dimension Fest, ao lado de The Damnnation, Eskröta, Torture Squad e os australianos do Elm Street. E, nas palavras da guitarrista e vocalista Prika Amaral, nada mais justo do que finalizar um ano cheio da mesma forma: com um show no SESC Bom Retiro no último dia 05.


O show, concebido como uma mescla de um setlist que contemplasse todas as fases da banda, vinha também com a proposta de contar uma narrativa entre as músicas, com histórias de bastidores e a construção dessas quase duas décadas de vida.


Mas antes disso, a banda aproveitou sua passagem pela cidade para realizar uma coletiva de imprensa na Arena Galeria, no dia 04 de dezembro, para um momento de intimismo com a mídia. Foi ali que revelaram ao mundo a chegada de seu sexto disco de inéditas, ainda sem nome, previsto já para o próximo ano.


O momento foi dividido entre perguntas gerais direcionadas às brasileiras Prika Amaral e Gabriela Abud (bateria), à grega Helena Kotina (guitarra) e à recém-chegada holandesa Emmelie Herwegh (baixo), solidificando esse status internacional da Nervosa. A seguir, nossas perguntas e um apanhado das questões dos colegas presentes.

nervosa no arena galeria em SP

Rato — Jailbreak (2023) serviu para introduzir você oficialmente aos vocais, e hoje é nítido o quanto está mais confortável na dupla jornada. O que o novo álbum trouxe na forma de desafios? E em que medida essa “segunda experiência” foi diferente?


Prika — A primeira vez foi completamente “no susto”. Eu já tinha tido algumas pequenas experiências antes, mas não me sentia pronta ou totalmente confiante. Eu mal tinha ouvido como minha voz realmente soava. Lembro de um episódio onde achei que estava péssima, e tanto a Helena quanto o Furia (produtor) ficaram empolgados com o resultado. À medida que tudo evoluiu e fui ganhando mais confiança, passei a querer viver mais isso.


Hoje, isso se reflete no novo álbum: quis experimentar mais, tentar novas vozes, fazer outras coisas, e o próprio Furi achava que seria difícil. Eu me senti segura sabendo que daria conta.


Rato — Pensando no novo álbum, desde composição, produção e gravação até as futuras performances ao vivo, o que vocês diriam que foi ou será a parte mais difícil e a mais legal?


Helena — Para mim, o mais difícil é conseguir transparecer todo o sentimento do álbum e aquilo que queríamos colocar ali para os fãs. Curiosamente, essa também é a parte mais legal.


Prika —Acho que o mais difícil é lidar com a velocidade das coisas e o quão rápido tudo pode virar “notícia velha”. A parte mais legal são momentos como esse, em que vemos algo nascendo.

coletiva de imprensa da nervosa em são paulo

Rato — E Helena, baseado no que você disse: qual seria, em uma palavra, o sentimento que você quer transmitir com esse álbum?


Helena — Brutalidade… MUITO FODA! (disse em português).


Prika — Equilíbrio.


De modo geral, as falas de Prika e as respostas dadas à imprensa orbitavam essa nova fase da Nervosa. Ela ressaltou a vinda de uma turnê brasileira do novo álbum para o segundo semestre do ano que vem e comentou brevemente sobre um caráter levemente conceitual — mas não totalmente — do disco. As músicas irão tratar temas contemporâneos e inquietações relacionadas à tecnologia, comportamento e ao sentimento de revolta que permeia o mundo atual. Este será também o primeiro álbum sem participações especiais, consequência da rapidez necessária em sua produção.


Sobre a formação atual — especialmente após a oficialização de Emmelie Herwegh como segunda baixista — Prika foi categórica ao dizer que estão navegando um território desconhecido, sem precedentes na indústria, refletindo a realidade de uma banda feminina, humana e em constante movimento. Diante da impossibilidade de encerrar um ciclo com uma integrante pelo simples fato de ela ter se tornado mãe (algo que, segundo Prika, jamais foi uma opção), mas precisando lidar com a intensa agenda de turnês, a solução encontrada foi o revezamento entre as baixistas. Uma forma de permitir que Hel Pyre viva plenamente seu novo momento enquanto mãe, sem prejudicar o ritmo da banda.


Houve também reflexões sobre representatividade, lembrando o impacto da saída de Fernanda Lira e Luana Dametto, e como esse momento trouxe uma enxurrada de mulheres interessadas nas posições e mensagens de apoio enfatizando a importância da Nervosa e pedindo que a banda não acabasse. Segundo Prika, isso jamais esteve em cogitação.

coletiva de imprensa da nervosa em sp

Ela falou ainda sobre a vida na estrada, lembrando da decisão de abandonar um emprego estável no setor bancário para mergulhar de cabeça na música. Hoje, vivendo do metal, enfatiza tanto a beleza quanto o peso dessa escolha: é possível viver disso, sim, mas é árduo, exige comprometimento absoluto e conviver com a logística complexa de um país que, mesmo sendo uma potência de exportação e importação musical, ainda apresenta grandes desafios estruturais e logísticos.


No fim, uma coisa é certa: a Nervosa está mais viva do que nunca, e neste assoprar de velas reforça a importância e a necessidade de sua existência. Em pleno mês em que nunca se viu tantas ocorrências, casos e descasos envolvendo violência contra a mulher, ter uma força da natureza como esse quinteto se expressando e materializando sua fúria sonora no mundo funciona como um farol em um mar tempestuoso, lembrando a todos que o lugar de uma mulher é onde ela bem entender.


Um reflexo que, para além das manchetes e dos episódios diários nos jornais Brasil afora, precisa ser revisitado, repensado e ressignificado dentro do próprio metal. Um meio que se vende como acolhedor e indiscriminatório, mas que, por vezes — e muitas mais do que gostaríamos de admitir —, ainda perpetua assédio, violência e preconceitos vindos de figuras frequentemente minimizadas sob o rótulo caricato de “tiozões do metal”. E nessa tentativa de humorizar o termo, acaba-se mascarando comportamentos estruturais que mancham uma subcultura que sempre se pretendeu ser de minorias, de resistência e de contracultura.


São nessas águas tortuosas que a Nervosa segue navegando com maestria, mostrando que em um mundo de Barbas Negras, Marrons, Douradas e Azuis, ainda existem muitas Zheng Yi Sao espalhadas pelo mundo.

coletiva de imprensa da nervosa em sp

Sobre a Nervosa


Formada em 2010 por Prika Amaral e a primeira baterista, Fernanda Terra, a Nervosa nasceu no coração do thrash metal brasileiro com uma proposta clara: resgatar a brutalidade, a estética e o espírito da velha guarda. O impacto foi imediato. Já em 2012, o clipe de Masked Betrayer estourou no YouTube, abrindo as portas para que a banda assinasse com a Napalm Records e lançasse Victim of Yourself (2014), um debut que pavimentou turnês extensas pela Europa, América Latina e Estados Unidos, colocando o nome da Nervosa entre os novos expoentes do metal mundial.


A banda manteve o ritmo frenético nos anos seguintes com Agony (2016), Downfall of Mankind (2018) e Perpetual Chaos (2021), cada um consolidando sua presença em festivais como Summer Breeze, Brutal Assault, Metal Days e até no palco gigante do Rock in Rio diante de mais de 70 mil pessoas. Em 2023, uma nova guinada redefiniu o grupo quando Prika assumiu também os vocais e lançou Jailbreak, álbum que se tornou rapidamente o mais aclamado da carreira, impulsionando turnês globais ao lado de nomes como Decapitated, Exhorder, Cradle of Filth e apresentações marcantes no Tons of Rock e no Hellfest.


Em 2025, ao celebrar quinze anos de estrada, a Nervosa chega à sua formação atual com Prika Amaral (vocal e guitarra), Helena Kotina (guitarra), Gabriela Abud (bateria) e o revezamento das baixistas Emmelie Herwegh e Hel Pyre. Com o novo álbum previsto para 2026 e uma agenda que segue crescendo em ritmo insano, a banda reafirma seu lugar como uma das principais forças do metal contemporâneo e um dos nomes mais influentes da história do thrash feminino no mundo.

coletiva de imprensa da nervosa